7.9.08

Reserva Ilegal?





Eder Zanetti, Eng Florestal, doutorando UnB
Promover o desenvolvimento sustentado, garantia de qualidade de vida para os
brasileiros desta e das novas gerações, é dever de Estado, garantindo os
direitos de todos os cidadãos. Para desenvolver-se o País precisa ter
condições de competir nos mercados globais. Um dos direitos fundamentais é a
saúde.
A reserva legal, no Brasil, foi instituída pelo código florestal de 1965, no
seu artigo 1º . Naquela época, a intenção clara era a de prover a indústria
com reservas de madeira suficiente, tendo em vista a substituição crescente,
nas propriedades rurais, de florestas por outros usos da terra.
Essa estratégia foi ampliada, na MP 2166-67, aonde lê-se que Reserva Legal é:
área localizada no interior de uma propriedade ou posse rural, excetuada a de
preservação permanente, necessária ao uso sustentável dos recursos naturais, à
conservação e reabilitação dos processos ecológicos, à conservação da
biodiversidade e ao abrigo e proteção de fauna e flora nativas.
É importante verificar que a instrumentação necessária para garantir estoques
de madeira e conservação da natureza inexistia, quando da redação do Código
Florestal que, por isso mesmo, obrigava os proprietários rurais a conciliarem o
desenvolvimento com a demanda da sociedade em torno das florestas. Tudo isso
mudou com os novos dispositivos legais.
O PNF - Programa Nacional de Florestas, é a instituição governamental
responsável pela garantia do fornecimento de madeira para a indústria, tanto de
plantações como de florestas nativas, tendo diferentes programas voltados para
esse fim.
Quanto ao segundo aspecto, incorporado pela MP2166-67, vê-se coberto por
diferentes instrumentos legais, destacando-se, sobremaneira, o SNUC - Sistema
Nacional de Unidades de Conservação e os projetos de Corredores Biológicos.
Hoje o Brasil tem mais Unidades de Conservação que qualquer outro país do mundo
e as plantações florestais brasileiras são campeãs planetárias de
produtividade. O que sem dúvida é muito bom para o País, que concilia uma
vasta rede de unidades de conservação com um poderoso setor florestal
industrial.
Contudo, a resistência em se abdicar de uma restrição ao uso da terra
brasileira, tem imposto sérias e crescentes sanções a capacidade competitiva do
País no terreno internacional. Tanto que, em relatório preparado pelo governo
dos EUA, para reunião com o G-8 neste ano de 2005, a respeito da proposta do
grupo, de boicote à madeira ilegal, aparece claramente demonstrado que os
produtores daquele país, se estivessem na Amazônia Brasileira, seriam todos
"ilegais".
Não somente isso, mas a Irlanda, fazendo eco às discussões européias sobre o
agronegócio, incitou seus pares a realizar um boicote a carne brasileira, tendo
em vista os níveis de desmatamento no Brasil. O mesmo procedimento tem sido
promovido em diferentes organizações, principalmente com o apoio de ONGs
ambientalistas de larga infiltração, sugerindo a adoção de barreiras
não-tarifárias para a soja brasileira.
Não existe, no Primeiro Mundo, conceito equivalente à Reserva Legal brasileira;
isso, sem dúvida, coloca em cheque essa estratégia de restrição ao uso das
propriedades brasileiras, já que elas passam a arcar com um ônus que não se
aplica aos produtores dos demais países.
Mas também não param por ai os prejuízos da Reserva Legal para os produtores
brasileiros. Com 1/5 da propriedade inutilizada, os proprietários ficam com
uma reserva que não serve apenas as espécies de fauna e flora ameaçadas, mas
também a biodiversidade que ameaça. Inúmeros trabalhos científicos já
evidenciaram a alta incidência de ratos, baratas, gambás, lagartas e diversos
outros componentes da fauna que utilizam fragmentos florestais como lar.
Nesses locais, eles reproduzem-se livremente e multiplicam as chances de
atingirem a população de humanos.
Com 4/5 das propriedades esse perigo aumenta a níveis inadmissíveis. É
cotidiano o ataque de plantações e animais por indivíduos oriundos de áreas de
Reserva Legal. Na Amazônia, existem estimados 15milhões de diferentes espécies
de insetos. A Febre Aftosa, que causa prejuízos imensos a pecuária nacional,
migra das criações vacinadas para os animais selvagens, retornando para atingir
os animais domésticos em um período posterior.
Na década de 70 ocorreram, na Amazônia, 5 epidemias oriundas de doenças que se
multiplicam nas áreas de florestas nativas. Nos anos 80 foram 6 e na de 90
elas chegaram a 13. A OMS - Organização Mundial de Saúde, abriu a reunião de
2005 trazendo à tona a questão das doenças tropicais, que flagelam 500milhões
de pessoas no mundo. O caso da mutação do vírus da SARS, que se originou de
florestas tropicais, é um dos mais graves do planeta hoje.
Morcegos já mataram 13 pessoas de raiva, este ano, no Pará. A doença de Chagas
atingiu as populações do Sul do Brasil. Roraima bateu recordes de infestação
com Dengue a o Acre tem recordes mundiais de casos de malária.
Enquanto as florestas tropicais estavam isoladas do resto do mundo, a
quantidade e o perigo de propagação das doenças que elas continham, e
viabilizavam, só era conhecido localmente. Com a globalização não somente essa
realidade passou a ser cotidiana, como também passou a ameaçar toda a
população.
Em uma sociedade sem fronteiras, a facilidade do espalhamento de epidemias é
gigante. Os prejuízos causados pela ocorrência da SARS na Ásia, em termos
econômicos e sociais, tornaram-se de conhecimento geral, principalmente com o
isolamento promovido para assegurar que o mal não se espalhasse pelo mundo.
É preciso garantir a segurança da população e a competitividade brasileira. A
responsabilidade pela conservação da natureza e manutenção de estoques
florestais não é mais dos proprietários rurais, ela foi assumida por toda a
sociedade. Já existem mecanismos legais e instituições encarregadas desse
trabalho.
Para competir internacionalmente, é preciso que as regras válidas para os
produtores brasileiros, sejam as mesmas aplicadas aos demais proprietários
rurais pelo mundo.
A Reserva Legal já teve seus objetivos e aplicabilidade superados pela
legislação nacional, que cobrem não somente os aspectos de conservação da
biodiversidade, mas também os de pesquisa, desenvolvimento econômico e social.
Não se justifica diminuir a produtividade rural por conta desses objetivos.
Por outro lado, a crescente ocorrência de danos à saúde da população,
decorrentes da multiplicação e mutação dos microorganismos nas áreas com
florestas nativas, principalmente tropicais, justificam ações no sentido de
garantir a seguridade social, ameaçada pelas áreas de Reserva Legal.
Utilizar o termo Reserva Legal, para definir porções das propriedades rurais,
destinadas a diminuir a competitividade dos produtores brasileiros, e ameaçar a
saúde de nossa população, é sem dúvida, um contra-senso.

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